soldadeira en San Miguel do Monte (Chantada)

Escena de baile cortesán de época medieval, con músicos e soldadeira.
Tímpano da porta sur de San Miguel do Monte (Chantada), s. XII.

Tem-se injustamente acusado a um dos géneros maiores da lírica medieval hispánica feita em romance Ocidental, a cantiga d' amigo, de ser popular e ingénua, umha sorte de lírica espontánea e autóctone da Gallaecia Magna que manifestaria a alma colectiva do povo galego. Menéndez Pidal falava dumha “hábil simplicidade” que se oporia com a maior feiçom das cantigas de amor importadas directamente da Ocitánia. No entanto, e como Tavani assinala as cantigas d' amigo “são o que de menos ingénuo e espontâneo, o que de mais elaborado e literário se pode imaginar”.


A cantiga d' amigo liga-se com toda a poesia que na Europa tinha como eu lírico a umha mulher, feito inusitado numha sociedade sob o rígido controlo do patriarcado. Exemplo destas outras cançons de mulher som as chansons de toile, as cançons de mal – maridada, as lamentaçons pola partida do cruçado... e ainda muitas outras na poesia siciliana, bizantina ou alemá da Idade Média. Nom podemos tampouco obviar as kharağat, os versos finais das muwaššahat árabes que iam em romance moçárabe e onde as mulheres dialogavam com o seu habib, o amigo das nossas cantigas. Contodo, cumpre pôr em destaque que a cantiga d' amigo é um género por inteiro e nom umha produçom fragmentária ou complementar e que, portanto, alcança umha profundidade e requintamento únicos na Europa.


Em todo caso, esta poesia de mulher aponta para umha realidade anterior ao século XII, quando após a queda do Império Romano o estatus da mulher viria-se sensivelmente melhorado, em especial pola sobrevivência nos povos germánicos do direito gentil e polo acesso à propriedade das mulheres nobres na Ocitánia onde atingiu um grau de liberdade – como se pode ver numha análise da poesia ocitana e da heresia dos albigenses – que tardaria séculos em repetir-se.


A falta, infelizmente, dumha recessom completa das cançons de mulher nas diferentes traiçons europeias e mediterráneas, que permita estabelecer as características e a tipologia de cada domínio, semelha que a tese mais plausível é a da monogénese da poesia “feminina” medieval. Umha poesia feita polos homes e para os homes – com a salvidade das trobairitz ocitanas –, ainda que com um ressabio popular que indubitavelmente tivo que servir-lhe de suporte para umha elaboraçom dos elementos repertoriais culta desenvolvida nas cortes ibéricas em constante diálogo nom apenas entre os autores, mas tamém com a poesia lírica ocitana, a primeira lírica de expressom romance em toda a Europa – o termo poeta reservava-se para os produtores em latim – . Resulta paradoxal que os principais focos daquela lírica, a Ocitánia, a Sicília, a Catalunya e a Galiza sejam hoje naçons sem estado que compartilham umha mesma luita pola sua emancipaçom. A história europeia foi da épica e da barbárie e nom da lírica e o diálogo. A história foi, em definitiva cousa dos estados e nom dos povos.
O outro papel que jogou a mulher no “espectáculo trovadoresco”, como António Resende de Oliveira o tem definido, foi como soldadeira. O seu nome recebem-no da soldada que recebiam por dançar e bailar. As referências literárias a estas mulheres, em que destaca Maria Balteira, conhecemo-las polas cantigas de escarnho e maldizer, mas nunca faziam referência à sua arte, mas as alusons da sua condiçom de “mulheres de má vida” desde as inalteradas convençons patriarcais do onte e do hoje. As soldadeiras eram mulheres excluídas num mundo onde só o convento ou ou o matrimónio eram opçons possíveis. O “pecado” da Balteira foi ser fidalga e decidir-se por um ofício próximo à prostituiçom. Ao igual que os trovadores se mofavam dos jograres que aspiravam a saltar-se o corsé estamental da sociedade medieval, a Balteira foi alvo de hiperbólicos ataques por ser mulher e elixir o seu próprio caminho sem tutelas masculinas durante os reinados de Fernando III e Afonso IX da Galiza (X de Castela). Tanto é assi que Maria Balteria remata por erguer-se como um tópico literário das cantigas escarninas e como um símbolo para todas as galegas de qualquer época... e a puta rebelde tornou-se em santa proletária para os anseios de emancipaçom de meia humanidade sistematicamente negada e humilhada por umha monogamia unidireccional.
* Texto: colaboración de Antom Fente Parada.

* Foto: Alfonso Campos.

2 comentários:

  1. Tinhamos que fazer um estudo histórico-literário sobre o "espectáculo trovadoresco", como lhe chama António Resende de Oliveira, na nossa comarca com um apartado e análise do papel da mulher (cantigas de amigo, a senhor na cantiga de amor e o papel das soldadeiras na encenaçom do espectáculo trovadoresco). Fica aí a ideia. Umha aperta irmandinha

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  2. Unha idea estupenda. O meu tío (Xesús Verao) seguro que está encantado.

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